Encontro de Intenções
Respiro, peço luz e discernimento para poder descobrir o que
nessa busca pela Humanização do Nascimento é realmente importante de ser dito,
vivido e sentido. Escolhi refletir sobre a questão da segurança para que
pudéssemos mexer um pouco nos nossos conceitos. O dicionário Aurélio me
confirma que segurança é um estado do que se acha seguro, confiante, o que me
faz pensar se existe fora de cada um de nós garantias que nos façam sentir
seguros. E assim convido você a refletir: qual é a segurança necessária para um
bebê e uma mãe no momento do nascimento?
Graças a evolução da ciência nosso bebê já é reconhecido,
desde a vida intra-uterina, como ser que tem um desenvolvimento cortical
avançado, uma vida psíquica. Toda e qualquer atitude que tomarmos em relação a
dupla mãe-bebê precisa ser cercada de respeito e carinho com o objetivo de
fazê-lo sentir-se confiante para que possa transmitir ao seu bebê uma “estada
segura”.
Algumas décadas atrás não havia necessidade de aparatos
técnicos e de intervenções médicas nos partos. Será que era só porque não
existiam os recursos? O que será que aconteceu na história, nos últimos trinta,
quarenta anos, no desenrolar do processo da gestação e trabalho de parto para
necessitar de tanta interferência?
Talvez muitas de nós já tenhamos agradecido por termos nos
prevenido e escolhido um hospital bem aparelhado e uma equipe competente que
nos salvou de um acidente de percurso da natureza, sem nos questionarmos se o
que aconteceu não foi consequência de uma
rotina deturpada. É fato que cada um dos procedimentos que a medicina tem a mão
é de valor inegável, mas será que inúmeros desses recursos não estão sendo
usados em todas nós, apenas para prevenir possíveis acidentes injustificáveis
nos dias de hoje, quando eram para ser usados somente quando se fizessem
necessários? Em época tão violenta e assustada tendemos a buscar todas as garantias
que possam nos prevenir dos riscos. Mas não serão essas mesmas garantias que
geram mais medos e tensão e que acabam favorecendo para que os acidentes
realmente aconteçam? E nos paralisem na certeza que cada vez funcionamos com
menos eficiência enquanto mulheres parideiras?
Imagine uma outra atmosfera com a mulher sendo reforçada
enquanto fêmea, estimulada a seguir sua intuição, esse bebê sendo convidado a
vir à vida sem empurrões, sem falta de oxigênio, sem gritarias de “força,
força!” numa batalha pela sobrevivência. Quantas vezes, observando um
nascimento, parece-nos que a mulher está sendo orientada a lutar contra o que
seu corpo está fazendo naquele momento? Ouvem-se frases do tipo: “só depende de
você!”, “só não nasceu porque você não está sabendo fazer força...” Não
devíamos nos perguntar o que aconteceu durante o trabalho de parto para estar
precisando de um esforço, às vezes sobre-humano, para deixar que esse neném
saia? Não seria mais adequado falarmos de entrega e permissão do que força e
empurrões?
A atmosfera que cerca o nascimento e todos os que nele estão
envolvidos clamam por um posicionamento a favor da saúde e da vida. Cabe a nós,
que trabalhamos com nascimento, não sobressaltar esses pais, nem os ameaçarmos
com possíveis imprevistos e sim compartilharmos desse momento enquanto seres
humanos que escolhemos ser “recepcionistas da vida”.
Vania Maciel
Texto publicado no jornal “O Ventre” - Casa do Parto Nove
Luas, Lua Nova – junho de 1995
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